O que mais tenho lido nos últimos meses são comentadores de O Banquete de Platão pela via da psicanálise, numa das minhas andanças a procura de livrosO que mais tenho lido nos últimos meses são comentadores de O Banquete de Platão pela via da psicanálise, numa das minhas andanças a procura de livros sobre Platão e o amor encontrei essa série de filósofos para crianças (Beauvoir e igualdade, Sócrates e verdade, Aristóteles e felicidade, Descartes e imaginação, Confúcio e bondade) e achei bonitinho. Claro que para a mente adulta parece raso demais, já que nem tem a inclusão de Eros no amor platônico, pois talvez as crianças não entenderiam (olha eu subestimando as crianças, tsc tsc), mas acho bem bacana para apresentar filosofia básica para as crianças menores, daí para elas passarem para O mundo de Sofia é um passo....more
Meu primeiro Raymond Chandler. Meu primeiro Philip Marlowe. Acho que o que mais impressiona na escrita do Chandler é que ele deixa o leitor investigar Meu primeiro Raymond Chandler. Meu primeiro Philip Marlowe. Acho que o que mais impressiona na escrita do Chandler é que ele deixa o leitor investigar e chegar às mesmas conclusões do Marlowe, é uma jornada interessantíssima e cujo twist não importa porque o leitor seguiu as mesmas pistas e já está ciente de antemão. Isso é tratar o leitor com respeito e não como fosse um policial burro, né, hahaha. Adorei. O engraçado é que apesar do meu Marlowe favorito de cinema ser o Elliott Gould, o tempo todo ao ler o livro visualizei o Bogart, mesmo sendo o Robert Montgomery quem estava na adaptação desse livro....more
Uma Volta pela Lagoa da Juliana Krapp já estava no meu radar desde que foi publicado pelo Círculo de Poemas, mas depois que foi indicado finalista ao Uma Volta pela Lagoa da Juliana Krapp já estava no meu radar desde que foi publicado pelo Círculo de Poemas, mas depois que foi indicado finalista ao Oceanos não tinha mais razão de adiar sua leitura. E que achado! Krapp escreve há décadas, tendo sua poesia esparsa aqui e alí, mas esse é seu primeiro livro completo e é maravilhoso, nunca cai numa poética fácil, suas imagens são complexas, quando não arrebatadoras.
As bonecas
Quando meu bisavô retornou da roça à casa naquele dia o primeiro dia de sua vida de casado não encontrou a mesa posta camisas engomadas cômodos limpos
Em vez disso encontrou minha bisavó brincando de boneca o que tem sido narrado às risadinhas pelas gerações seguintes até a história chegar a mim eu que desde criança tento imaginar como eram aquelas bonecas com as quais brincava minha bisavó
Se por acaso tinham pele de trapo encardido e vísceras de palha (decerto) se tinham cabelos feitos de cabelos de milho (decerto) se os olhos eram arregalados (decerto) como costumam ser os olhos das bonecas de quase todos os tempos e lugares e como provavelmente eram também os olhos da minha bisavó ao ser estuprada naquela mesma noite a primeira noite de sua vida de casada
Só depois de adulta pude refletir sobre como é desafiador ceder à função nomeadora da linguagem que os poetas em geral e os contemporâneos em particular preferem rechaçar em benefício do jogo de sombreados que amplia o mistério em torno disso que chamamos arte poética
Nunca poderei saber que nomes minha bisavó atribuía às suas bonecas tampouco que tipo de encenações executava sobre a terra batida de sua nova sala na companhia de filhas ou amigas ou mães ou irmãs imaginárias a quem talvez servisse chá ou sopa imaginária enquanto no fogão a lenha logo ao lado nenhum fogo crepitava nenhuma panela cozinhava comida de verdade como decerto era a expectativa de meu bisavô enquanto lavrava o solo e pastoreava o gado
Talvez nunca consiga me decidir se podemos nomear de estupro o fato de que há tantas décadas o casal composto por um homem de trinta anos e uma menina de catorze mergulhou em sua primeira noite na casa cercada por escuridão e ruídos da floresta por montanhas contendo pastos pastos se desdobrando sobre a mata nascentes e córregos e represas e açudes atiçando a cobiça pela terra e se infiltrando no sono
Tenho dificuldades com nomes sejam eles próprios ou comuns o que delimitam jamais irá representar a trama de volúpias o impulso de mutações que se avolumam no escuro indecifráveis cruzamentos de sons e de águas correndo do lado de fora em contraste com o abandono das bonecas de olhos esbugalhados a encarar as ripas do teto ou o barro do chão tão semelhantes à minha bisavó e seus dois olhos redondos fitando aquela noite a primeira noite em sua nova cama
Quando meu bisavô foi assassinado minha bisavó não tinha mais catorze anos já tinha dezessete e decerto aprendera a alimentar a cerzir a esfregar e a amamentar pois tinha dois filhos naquela noite em que se casou de novo e teve de aprender também a ler os jornais em voz alta enquanto acendia o fumo para seu novo porém segundo marido que gostava muito de saber as notícias mas não apreciava lê-las com os próprios olhos admito que essa parte da história não me interessa tanto as bonecas em minha memória inventada já haviam saído de cena
Prefiro a essa altura pensar no piano que minha mãe teve que vender aos quinze, convencida a se casar ou na carta de despedida que minha tia-avó deixou e que foi rasgada em pedacinhos quando, aos vinte, fugiu do marido com um marinheiro de baixa patente e ordenaram que fosse dada como morta para que ninguém no futuro jamais pudesse saber seu nome...more
Mary França provavelmente co-alfabetizou tantas crianças ao lado de muitas professoras nos últimos 40 anos para além do que podemos contabilizar e eu Mary França provavelmente co-alfabetizou tantas crianças ao lado de muitas professoras nos últimos 40 anos para além do que podemos contabilizar e eu fui uma dessas crianças. A notícia de sua morte me comoveu profundamente, ela que é uma das maiores responsáveis por me ensinar o prazer da leitura e meu consequente amor pelos livros. Um rombo tremendo no coração de muitos leitores, sem dúvida....more
Mary França provavelmente co-alfabetizou tantas crianças ao lado de muitas professoras nos últimos 40 anos para além do que podemos contabilizar e eu Mary França provavelmente co-alfabetizou tantas crianças ao lado de muitas professoras nos últimos 40 anos para além do que podemos contabilizar e eu fui uma dessas crianças. A notícia de sua morte me comoveu profundamente, ela que é uma das maiores responsáveis por me ensinar o prazer da leitura e meu consequente amor pelos livros. Um rombo tremendo no coração de muitos leitores, sem dúvida....more
Esse é o sexto livro que leio do Garcia Marquez e ainda há muito que ler, coloquei esse na frente porque a adaptação para cinema do Ripstein está compEsse é o sexto livro que leio do Garcia Marquez e ainda há muito que ler, coloquei esse na frente porque a adaptação para cinema do Ripstein está completando 25 anos e veremos como se deu. Garcia Marquez escreveu o roteiro do primeiro filme do Riptstein nos anos 60, Tempo de morir, ao lado do Carlos Fuentes, um filme de que gosto muito. Quanto a essa novelinha, Ninguém escreve ao Coronel, há algo de Deserto dos Tártaros ou Esperando Godot nela, essa eterna espera, mas pela via do realismo mágico. ...more
É tão bom encontrar uma autora com a qual você se identifica completamente em termos de políticas dos afetos! Como uma boa aquariana clássica (rá!), sÉ tão bom encontrar uma autora com a qual você se identifica completamente em termos de políticas dos afetos! Como uma boa aquariana clássica (rá!), sempre privilegiei relações de amizade acima de qualquer interesse romântico, porém a nossa sociedade é tão doentiamente calcada no ideal de monogamia capitalista que o amor acabou virando uma propriedade privada. É disso que trata o livro da socióloga e psicanalista Ingrid Gerolimich, de como algo tão belo como o amor, se tornou algo tão mesquinho na sociedade capitalista. Sempre lembrando de perguntar: já amaram suas amigas hoje?...more
Embora escrito em 1969 e naqueles idos a questão da compulsão alimentar não fosse tão premente quanto na sociedade ansiosa atual, dá sim para ver esseEmbora escrito em 1969 e naqueles idos a questão da compulsão alimentar não fosse tão premente quanto na sociedade ansiosa atual, dá sim para ver esse livro com essa chave de leitura. O que importa é que ao final ela se transforma numa borboleta....more
Ser poeta não é a primeira coisa que vem à mente quando tratamos de James Baldwin, cujo centenário estamos comemorando esse ano, mas talvez seja um erSer poeta não é a primeira coisa que vem à mente quando tratamos de James Baldwin, cujo centenário estamos comemorando esse ano, mas talvez seja um erro já que a prosa dele é suficientemente poética para chamá-lo assim. A questão é que ele passou a vida fazendo poesia, seja a escrevendo, seja a vivendo de forma combativa, nessa pequena edição saída em 2014 que reúne a antologia oitentista Jimmy's Blues, somada a outros poemas, podemos ver a escrita e que não por acaso são de fato blues: política e afetivamente. ...more
Tem umas semanas discutimos o trabalho fotográfico da Cindy Sherman no nosso grupo de estudos sobre Psicanálise e Arte, logo depois, por uma total coiTem umas semanas discutimos o trabalho fotográfico da Cindy Sherman no nosso grupo de estudos sobre Psicanálise e Arte, logo depois, por uma total coincidência, eu tinha programado de ver o único longa que ela dirigiu nos anos 90: Office Killer, um slasher que é muito menos falado que deveria, já que ele é uma espécie de precursor feminista de American Psycho. Bom, só esse fim de semana parei para ter um olhar mais demorado no seu livro Untitled Film Stills e ele é um verdadeiro compêndio da mulher no século XX. Se as fotos foram tiradas em fins dos anos 70, na verdade elas abrangem personificações de várias eras, mostrando uma atemporalidade e negação da espacialidade em conjunção. O mais gostoso é ver o lampejo de divas do cinema em cada uma delas. Coisa fina. ...more
Amelia Bedelia que era mulher de verdade... lançado pela primeira vez em 1963, a personagem clássica de Peggy Parish já rendeu dezenas de livros e é fAmelia Bedelia que era mulher de verdade... lançado pela primeira vez em 1963, a personagem clássica de Peggy Parish já rendeu dezenas de livros e é fácil ver porquê. Entre ser anarquista ou autista (ou autista anarquista), Amelia Bedelia tem uma forte vibe de As Pequenas Margaridas da Chytilová que chegaria aos cinemas três anos depois desse livro. Uma delicinha....more
Outro livrinho com ilustrações do SD Schindler que encontrei no archive.org , dessa vez com brincadeiras em torno de trocadilhos vários em relação ao Outro livrinho com ilustrações do SD Schindler que encontrei no archive.org , dessa vez com brincadeiras em torno de trocadilhos vários em relação ao macabro. Bem divertido....more
Deveria ter lido esse ontem à noite, mas fiquei tão encantada com as ilustrações do SD Schindler nos livros de gatos alados da Ursula Le Guin que fui Deveria ter lido esse ontem à noite, mas fiquei tão encantada com as ilustrações do SD Schindler nos livros de gatos alados da Ursula Le Guin que fui procurar mais do seu trabalho no archive.org . One Spooky Night/One Witch é um livro bem divertido que ensina que bruxa sabe muito bem o que é práxis comunal, no dia de Halloween ela sai pegando ingredientes de toda a vizinhança para fazer uma grande festa à noite e o leitor também é convidado....more
Eu ia ler numa tacada só os quatro livrinhos da série sobre gatos alados da Ursula Le Guin porque são curtinhos e rápidos, mas o primeiro já me foi doEu ia ler numa tacada só os quatro livrinhos da série sobre gatos alados da Ursula Le Guin porque são curtinhos e rápidos, mas o primeiro já me foi dolorosamente difícil de ler por conta de traumas recentes em minha vida. Esse primeiro volume trata de gatinhos com asas que seguem caminho sem a mãe e encontram humanos que respeitam a sua liberdade, aceitando-os como são....more
Os diários de Sylvia Plath ultimamente têm me chamado para que eu os leia, já está na minha estante há anos, mas antes quis ler esse continho que foi Os diários de Sylvia Plath ultimamente têm me chamado para que eu os leia, já está na minha estante há anos, mas antes quis ler esse continho que foi primeiramente rejeitado para publicação sem razão de ser. Claro que arte pode ser interpretada de diversas maneiras, mas a minha leitura desse conto respinga na jornada da morte, isso seria uma recorrência em Plath desde sempre e não tem porque eu tentar ler de outro jeito, mesmo porque desde sempre igualmente me identifiquei com isso. Psicanalticamente dá para desmontar como uma cebola....more